A recente notícia de um jovem que enganou a portaria e furtou R$ 650 mil em um condomínio no Rio de Janeiro acende um alerta importante: criminosos têm sofisticado táticas de engenharia social para burlar rotinas de acesso. Em cenários assim, a diferença entre um incidente grave e um "quase" é, muitas vezes, a combinação de procedimentos claros, tecnologia adequada e, principalmente, uma portaria bem treinada e apoiada pela gestão do condomínio.

A seguir, apresento um guia prático para síndicos, administradoras, moradores e equipes de portaria, com medidas concretas que elevam o nível de segurança e reduzem drasticamente a chance de ocorrência de fraudes e furtos.

Onde costumam ocorrer as falhas

  • Excesso de confiança e abordagem "libera primeiro, verifica depois"
  • Processos de identificação frágeis (sem foto, sem cruzar dados, sem histórico)
  • Falta de confirmação ativa com o morador (ligação ou app) antes de liberar acesso
  • Pressa e pressão do visitante ("estou atrasado", "o síndico sabe", "sou da manutenção")
  • Ambientes físicos que facilitam "carona" no acesso (tailgating) ou "elevador social aberto"
  • Falta de registro e de rastreabilidade (sem logs, sem gravações claras)
  • Treinamento pontual, sem reciclagens periódicas ou simulações

O papel estratégico da portaria

A portaria é a primeira barreira de proteção do condomínio. Um porteiro bem treinado:

  • Atua como agente de segurança e atendimento, seguindo POPs (procedimentos operacionais padrão)
  • Mantém postura cordial e assertiva, mesmo sob pressão
  • Aplica protocolos de identificação e autorização sem exceções
  • Registra tudo: quem, quando, por que e como entrou/saiu
  • Comunica rapidamente ocorrências à gestão e aciona protocolos de resposta

Regra de ouro: ninguém entra sem autorização verificada e registrada. Sem exceções.

Medidas práticas para elevar a segurança agora

Identificação rigorosa

  • Exigir documento oficial com foto e conferir semelhança facial
  • Fotografar visitante e documento (quando permitido pelo regulamento e LGPD)
  • Registrar motivo da visita, unidade de destino e responsável que autorizou

Autorização ativa com retorno

  • Confirmar a entrada sempre com o morador via ligação, interfone ou aplicativo
  • Evitar autorizações apenas "por recado"; exigir confirmação direta
  • Criar senhas de verificação para prestadores recorrentes

Controle de prestadores de serviço

  • Ordem de serviço com data/hora, empresa, responsável e atividade
  • Crachá temporário visível e coleta de assinatura na entrada/saída
  • Conferência de ferramentas e volumes (entrada e saída)
  • Proibir subcontratações não informadas previamente

Gestão de entregas e encomendas

  • Área/locker de entregas fora do perímetro habitacional quando possível
  • Regra clara para entregadores: não acessar elevadores/andares sem autorização
  • Entregas de alto valor: confirmação dupla e retirada pelo morador

Prevenção de "carona" (anti-tailgating)

  • Eclusa/antecâmara com dois portões para pedestres
  • Cancelas e barreiras físicas para veículos com leitura de placas
  • Sinalização clara: é proibido acompanhar outro morador na entrada

Controle de chaves e cópias

  • Chaves em chaveiro lacrado, com registro de retirada/devolução
  • Proibição de guardar chaves de unidades na portaria (salvo plano aprovado e controlado)
  • Auditorias periódicas

CFTV inteligente e posicionamento estratégico

  • Câmeras com boa iluminação, ângulos de rosto, entradas e elevadores
  • Retenção de imagens por período adequado e backup automático
  • Sinalização visível de monitoramento

Acesso com múltiplos fatores

  • Biometria, cartões temporários e QR codes com validade
  • Autorização prévia para visitantes e prestadores via aplicativo/portal
  • Trilhas de auditoria automáticas

Roteiros e checklists para a equipe

  • Scripts de abordagem e de confirmação
  • Checklist de troca de turno, rondas e testes de sistemas
  • POPs impressos na portaria e disponíveis em formato digital

Simulações e reciclagens

  • Treinos trimestrais com cenários de engenharia social
  • Simulações de emergência (acesso de bombeiros, ambulância, polícia)
  • Avaliação pós-treino com planos de melhoria

Cultura de segurança com os moradores

  • Campanhas informativas: "Não autorize desconhecidos", "Não abra o portão para terceiros"
  • Cadastro prévio de visitantes e prestadores
  • Notificação à portaria quando houver serviços agendados

Política para situações de pressão

  • Frases-chave: "Por segurança, preciso confirmar a autorização"
  • Escalonamento: acionar supervisor/síndico ao primeiro sinal de inconsistência
  • Nunca ceder por pressa, grosseria ou "autoridade" alegada

LGPD e privacidade

  • Coletar o mínimo de dados necessário, com base legal e finalidade definida
  • Informar políticas de retenção e descarte de dados
  • Restringir acesso aos registros a pessoas autorizadas

Portaria remota x presencial

  • Presencial: excelente para condomínios com grande fluxo e necessidade de contato humano
  • Remota: pode reduzir custos e padronizar procedimentos, desde que o projeto físico e a conectividade sejam impecáveis
  • Híbrido: combina supervisão remota com apoio local, fortalecendo redundância

Auditoria contínua

  • Indicadores: tempo médio de autorização, incidentes por mês, não conformidades
  • "Cliente oculto" (teste de penetração social) semestral
  • Revisão de POPs a cada 6?12 meses
Deixe seu Comentário